14 julho, 2010

Extremos do Organismo: Dor (2)

  • Teorias da dor


O estudo da dor tem gerado discussões e controvérsias entre os especialistas. Várias teorias foram apresentadas para explicar, ou procurar esclarecer esse fascinante fenômeno. Entre elas a mais clássica é a da especificidade e a mais recente a do controle do gatilho.

  • Teoria da especificidade –Foi proposta por Descartes em 1644, como um sistema da dor por um canal direto da pele para o cérebro. Esse conceito persistiu até o século passado, quando Muller postulou a transmissão do impulso apenas através dos nervos sensitivos. No final do século dezenove, Von Frey desenvolveu o conceito de receptores cutâneos específicos na mediação do toque, calor, frio e dor. As terminações nervosas livres foram implicadas como receptores da dor. Admitiu-se a existência de um centro da dor no interior do cérebro, o qual seria responsável pelas manifestações da experiência desagradável. Essa teoria foi responsável pelo surgimento de diversos métodos cirúrgicos na manipulação da dor crônica, por meio do seccionamento de nervos.

  • Teoria do controle do gatilho ou da porta-espinal – Foi proposta por Melzack & Wall em 1965. Muito embora possa ser exposta em termos simples, suas diversificações são extremamente complexas. Nem todos os seus aspectos estão suficientemente esclarecidos e nem receberam a concordância de todos os investigadores, mas essa teoria vem recebendo muita atenção atualmente, pelo fato de levar em consideração um elemento participante do mecanismo da dor : a emoção. As teorias que a antecederam eram facilmente compreendidas e lógicas, mas tinham uma grave falha: viam a dor simplesmente como um tipo de reação estímulo-resposta e ignoravam quase que totalmente o papel da emoção.

Durante a segunda grande guerra, Beecher, professor de Anestesiologia em Harvard, trabalhando em um hospital de campo em Anzio, observou que soldados gravemente feridos e que tinham toda a razão do mundo para suplicar por um alívio, recusavam obstinadamente qualquer medicamento para controle da dor. Simplesmente por terem sobrevivido mostravam-se tão eufóricos que, aparentemente, sua alegria bloqueava a dor. Da mesma maneira, outros investigadores notaram que atletas, como jogadores de futebol, comumente deixam o campo e só no vestiário descobrem sérias lesões no joelho ou tornozelo. Na excitação do jogo, não tomam conhecimento dessas injúrias.

A teoria do controle do gatilho pode explicar esses fenômenos e por isso foi considerada como revolucionária no estudo dos conceitos da dor. Em termos simples essa teoria pode ser exposta da seguinte maneira: os milhões de receptores do corpo conservam o cérebro abastecido de informações sobre temperatura e condições dos tecidos e dos órgãos. Como já visto, os receptores e o sistema nervoso central comunicam-se por meio de um complexo código neural, via de uma intrincada rede de nervos. O corte de um nervo ao microscópio assemelha-se a um cabo elétrico, feito de muitas fibras de várias espessuras. As mais grossas transmitem impulsos como os originados nos receptores do tato; as mais finas, de transmissão mais lenta, conduzem os impulsos de dor. Esses nervos convergem para a medula espinal e ali, aos autores da teoria admitem a existência de um mecanismo semelhante a uma porta que usualmente permanece fechada para bloquear a dor mas, às vezes, pode abrir-se para admiti-la.


Quando se arranha a pele suavemente, as fibras grossas conduzem impulsos que são percebidos, porém não traduzem uma sensação desagradável pois a "porta" conserva-se fechada. Se a pele continuar a ser arranhada, cada vez com mais força, mais receptores são estimulados e as fibras grossas sobrecarregadas fazem com que a "porta" se abra e as fibras finas aproveitam a oportunidade para enviar impulsos de dor, que passam através dela.


Ao contrário das outras teorias, os autores desta acreditam que quase todo o sistema nervoso central esteja envolvido no ato de decidir se a "porta" deve permanecer fechada ou abrir : a memória, o estado de espírito, a atenção, etc., têm participação na experiência da dor. As emoções positivas, como a excitação (no exemplo dos atletas) ou o prazer, fecham a "porta". As negativas, como a ansiedade e a apreensão, fazem-na abrir-se. Naturalmente a idéia de porta é puramente teórica e até agora não foi identificado positivamente nenhum mecanismo real no organismo que exerça essa função.


Mesmo admitindo-se que a percepção da dor é igual em pessoas sadias, alguns fatores têm influência definida sobre o limiar de dor de cada indivíduo.

  • Estados emocionais - O limiar depende em grande parte da atitude do paciente frente ao procedimento do operador e ao ambiente. Em regra geral, pacientes emocionalmente instáveis têm baixos limiares.

  • Fadiga - É fator de grande importância para o limiar de dor. Os pacientes descansados e que tenham dormido bem antes de uma experiência desagradável têm um limiar de dor muito mais alto que outros, fatigados e com sono. É essencial que uma boa noite de sono preceda o tratamento.


  • Idade - Os adultos tendem a tolerar mais a dor, apresentando portanto limiar mais alto que os jovens e as crianças. Talvez a compreensão que experiências desagradáveis são parte da vida influam na pessoa. Nos casos de senilidade a percepção da dor pode apresentar-se alterada.


  • Raça - As raças que apresentam indivíduos mais emotivos como os latino-americanos e os europeus meridionais têm limiar mais baixo que os norte-americanos e europeus setentrionais.


  • Sexo - O homem tem limiar mais alto que a mulher. Isso talvez reflita o desejo do homem de manter sua impressão de superioridade, fazendo esforço maior para tolerar a dor.


  • Medo - O limiar diminui à medida que o temor aumenta. Os pacientes medrosos e apreensivos tendem a aumentar exageradamente sua expectativa negativa. Esses pacientes são hiperreativos e tornam a dor fora de proporção em relação ao estímulo que a causou. É essencial que o operador adquira a confiança do paciente para levar o tratamento a bom termo.

Um comentário:

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